Quando a novela “Sonho Meu” estava no ar eu tinha menos de um ano. Até então filho único, minha mãe tinha o hábito de escrever sobre meu desenvolvimento em um caderninho. Entre tantas passagens que me chamam atenção, algumas me sobressaem, como essas ao lado que comprovam que sempre fui noveleiro.
Eu já (!) tinha dois anos quando estreou “O Rei do Gado”, escrita por Benedito Ruy Barbosa e dirigida por Luiz Fernando Carvalho,
e outro caso que contam é que, quando começava a abertura,
corria para frente da televisão e começava a falar “Bruno, Bruno”. Um pouco narcísico, reconheço. Mas estava ali eufórico para ver
o Antônio Fagundes brilhar como Bruno Mezenga, o rei do gado.
Essa é só uma das várias memórias que tenho em relação à televisão brasileira. Nasci e cresci em Ponte Nova, interior de Minas Gerais, onde não tinha muita coisa para fazer para se divertir. Quando criança ainda brincava na rua, perdia a tampa
do dedão jogando futebol descalço, ralava o joelho, subia
(e caia) em árvores. Mas, quando anoitecia e era hora de ir para casa, contava os minutos para terminar as tarefas escolares
para poder assistir televisão, mais especificamente as novelas.
Sempre troquei qualquer esporte por variadas formas de arte que sempre me interessavam mais, desde cozinhar até música (apesar de ter sido uma negação em aulas de instrumentos e canto), teatro e televisão. Troquei as quadras do colégio pelo palco do anfiteatro. A primeira peça foi do Ariano Suassuna, que logo se tornou um dos artistas que mais admiro de toda cultura nacional. Depois ainda vieram Nelson Rodrigues e Vinícius de Moraes.
Quase ao mesmo tempo que comecei nas aulas de teatro
fui convidado para apresentar um programa de entrevista no
canal da minha cidade, a TV Educar. Eu tinha 14 anos e foi o
convite que mudou tudo na minha vida. O programa era o
“Minha Escola na TV”, semanal e ao vivo por uma hora, onde conversei com as mais diversas personalidades, de médicos à reitor de universidade federal e políticos. Além deles, sempre alguma escola participava com uma penca de alunos. Dividi a apresentação com uma grande amiga por mais de três anos
e foi ali que descobri qual rumo profissional iria trilhar.
Desde que soube que queria cursar jornalismo, sempre
quis morar no Rio de Janeiro. De cara não deu, comecei a faculdade de Comunicação Social na Universidade Federal
de São João Del Rei, em Minas Gerais. Mas logo no primeiro semestre começou uma greve. Voltei para casa dos meus pais e nesse período fui convidado para o meu primeiro trabalho remunerado: apresentei o programa eleitoral do candidato
à prefeitura de Ponte Nova que venceu as eleições em 2012.
De volta à UFSJ comecei a participar de projetos de extensão
na universidade, como a VAN – Vertentes Agência de Notícias.
Foi para ela que fiz minhas primeiras coberturas como aprendiz
de jornalista. Visita da então presidente Dilma em SJDR, festival de gastronomia em Tiradentes e até a Jornada Mundial da Juventude, a primeira vez do Papa Francisco no Brasil. Um dos momentos
mais impactantes que meus olhos já vivenciaram foi ver mais de
3 milhões de pessoas em absoluto silencio a pedido do Papa durante a missa na praia de Copacabana. Só se ouvia os helicópteros e embarcações de segurança no mar.
Me inscrevi como voluntário para atendimento ao espectador, recepcionando o público chegada ao estádio, dando orientações. Foi o jeito que encontrei de participar ativamente de um dos maiores eventos do mundo e que estava acontecendo no nosso quintal. Eu, que nem gosto de futebol, assisti aos mais de
40 jogos da Copa, ou pela televisão ou ao vivo, no Mineirão,
sendo dois jogos da nossa Seleção: Brasil e Chile, nas oitavas
de final, que foi para os pênaltis; e o famigerado 7x1, contra a Alemanha. Outro momento bastante inesquecível que meus
olhos já presenciaram. Uma semana depois da final no
Maracanã lá estava eu no meu novo quarto no Rio.
Enfrentei mais duas greves na universidade. Aproveitei as duas férias forçadas e fui para os EUA para minha primeira experiência profissional no exterior. Filmava e editava vídeos de turistas brasileiros nos parques temáticos de Orlando. Era a temporada de verão em junho e julho de 2015 e 2016. Foi divertidamente insano.
Voltei obstinado em me mudar para o Rio de uma vez por todas! Consegui uma transferência de universidade para Federal Fluminense, em Niterói, para começar no segundo semestre
de 2014. Só que entre a mudança de cidade pra outra, fiz
uma parada em Belo Horizonte. Era a Copa do Mundo no Brasil!
(Não me contentei em morar lá do outro lado da ponte. Isso se comprovou um erro e me mandei pra Niterói no ano seguinte).
Já na UFF comecei a estagiar na Unitevê, o canal universitário.
Lá aprendi a ser repórter, produtor, editor, cinegrafista e pegar
mais prática na frente das câmeras e editar frame a frame.
Aprendi a ser jornalista! Fiquei por quase três anos, praticamente todo tempo de faculdade.
Depois de formado meu primeiro emprego foi na ONG
Uma Gota No Oceano, uma organização de comunicação voltada para causas socioambientais. Comecei produzindo conteúdo e lidando com métricas das redes sociais. Depois também comecei
a participar da criação e planejamento de campanhas, enviava avisos de pauta para imprensa, acompanhava audiências no STF, sessões especiais na Câmara dos Deputados, escrevia roteiros
para peças audiovisuais que também eu produzia a captação e editava o vídeo final. Duas campanhas que participei e me
enchem de orgulho foram a “Nenhum Quilombo a Menos”
e a “Em Nome de Quê?”.
A primeira foi em defesa dos territórios quilombolas que estavam ameaçados por uma ação no STF. Em sete meses de campanha revertemos o julgamento e milhões de brasileiros conseguiram manter seus direitos às terras tradicionais. Foram muitos avisos
de pauta, diversos artigos de opinião assinados pelos mais variados especialistas e publicados nos maiores jornais impressos do país, muitas notícias na TV aberta e na TV fechada,
diversas coberturas ao vivo e in locodos acontecimentos.
Desmotivado pela cena política brasileira em 2019 e depois de uma inspiradora conversa com um cacique Muduruku que me contou das lendas do jabuti na cosmovisão indígena, senti que precisava fazer uma transição de carreira. Resolvi voltar para onde sempre quis estar e focar em criar filmes e séries documentais. Meu amor pelo jornalismo se juntaria a minha paixão pelo audiovisual. Criei a Jabuti Entretenimento, uma produtora audiovisual registrada na Ancine. Mas veio a Covid-19 e tudo parou. Entre março de 2020 e dezembro de 2021 me dediquei inteiramente a essa mudança profissional. Aproveitei a oferta
de cursos que eram presenciais em São Paulo e passaram a
ser online e estudei roteiro com Jorge Furtado e Ana Abreu,
e ainda um curso de showrunner no Instituto de Cinema.
A segunda foi em defesa dos rios do Brasil, constantemente
maus tratados. Dividida em três fases, atuei na primeira a partir
do lançamento da peça audiovisual dirigida por Luiz Fernando Carvalho (sim, o mesmo diretor de “O Rei do Gado”) sobre o
Rio Juruena (MT). Na segunda parte fomos até o Pará, no Rio Tapajós, conhecer as aldeias do povo Munduruku. Pela primeira vez eu fiz toda a produção de uma peça audiovisual e que foi exibida na Conferência do Clima da ONU, na Polônia.
Foram duas semanas na Amazônia com um dos maiores diretores do país, uma equipe inteira de gravação, quilos de equipamentos, horas de voos, de estrada de terra e de barco. A terceira etapa
foi sobre a contaminação por metais tóxicos da barragem que rompeu em Brumadinho (MG) e atingiu o Rio São Francisco. Benedito Ruy Barbosa tinha escrito alguns anos antes a novela Velho Chico, também na TV Globo e dirigida pelo Luiz Fernando, que tinha aquele rio como um dos personagens.
Em outra viagem, dessa vez na ilha de edição, produzimos
uma nova peça audiovisual com imagens feitas pelo Luiz
e roteiro escrito por mim.
Em maio de 2022 surgiu a primeira oportunidade por algo que eu esperava, almejava e corria muito atrás desde 2012, quando entrei na faculdade de jornalismo: trabalhar com o Multishow. Foi vendo aqueles apresentadores em shows e festivais que eu sabia que meu objetivo era ser um deles. Na minha primeira vez, não como apresentador (ainda!), mas como produtor, foi no MITA Festival, onde estive ao lado de uma daquelas apresentadoras que me serve de inspiração até hoje: Dedé Teicher. Foi nossa primeira parceria, que depois se repetiu no Rock in Rio e no Numanice, ainda em 2022, e em 2023 no Tardezinha, novamente no MITA e ainda no Tomorrowland Brasil.
Além desses shows e festivais acompanhando a Dedé, também fui produtor da Xan Ravelli no Rock The Mountain, em 2023, com
direito a conseguir uma entrevista memorável, ao vivo,
da Renata Vasconcellos, jornalista e apresentadora do
Jornal Nacional, com a Lanza, sua irmã gêmea.
E também fiz a produção do Palco Brasil, no festival João Rock em 2022 e 2024, para transmissão no Canal Bis, por onde passaram Erasmo Carlos, Marcelo D2, Barão Vermelho, Marcelo Falcão, Novos Baianos, 14 Bis e Ney Matogrosso, todos no mesmo
palco que eu!
Em junho de 2022, mais uma aventura: produzi a série
“Passaporte Feminino”, para o canal Life Time. Rodamos milhares de quilômetros dentro da cidade de São Paulo para ouvir histórias de mulheres imigrantes de todas as partes do planeta e que escolheram a maior cidade da América Latina para construir um novo lar. Essa foi minha primeira produção em São Paulo e já cheguei fazendo pré-produção, transporte, locação, tudo!
Foi quase uma pós-graduação em dois meses de projeto.
Em agosto de 2022 trabalhei em algo que jamais pensaria que fosse trabalhar: o Criança Esperança! Eu passei anos da minha
vida esperando o dia que veria vários artistas juntos, no mesmo “festival”, ali pela televisão. Recepcionar tantos artistas que sempre admirei, ver aquele mesão cheio de gente atendendo telefone de gente doando, foi lindo.
O ano de 2022 terminou com a produção de transporte na
gravação do novo clipe do Pedro Sampaio com a Pabllo Vittar. “SAL” era uma mistura de praia com neve e em menos de 24h depois que comecei no projeto já estávamos gravando na praia
de Grumari e, no dia seguinte no estúdio, quase no verão do
Rio de Janeiro, com uma moto aquática esculpida em
blocos de gelo com um calor externo de quase 40ºC.
Em 2023 também ganhei um dos meus maiores presentes profissionais até hoje. Fui produtor do programa especial
do “Circuito Sertanejo”, para TV Globo, apresentado por
Kenya Sade e Rafa Kallimann, duas grandes novas potências
da televisão brasileira. Rodamos quatro estados na
Rota do Berrante, passando por Londrina (PR), Ribeirão Preto (SP),
Pedro Leopoldo (MG), Barretos (SP), Jaguariúna (SP) e Poços de Caldas (GO), sendo líderes de audiência do horário em todas elas.
Comecei o ano de 2024 como Analista de Produtos Publicitários,
no time de Negócios Integrados em Publicidade, da TV Globo, atuando na área de shows e festivais. Participei de dois grandes momentos do ano na televisão: o carnaval e o Lollapalooza.
No primeiro produzi o Minuto Brahma em três blocos patrocinados pela cerveja, em São Paulo, Salvador e Rio de Janeiro.
Neste ano também voltei para UFF, dez anos depois que cheguei pela primeira vez. Agora, em busca do título de mestre, estou estudando algo que sempre me criticaram por assistir demais e diziam que não daria futuro: novela. Aquele adolescente que
amava assistir as da seis, das sete, das oito, das nove, das onze, qualquer que fosse, jamais imaginaria que estaria na pós-
graduação em uma universidade pública (enfrentando mais uma greve!) e estudando este produto cultural valiosíssimo e genuinamente brasileiro. Coincidências da vida (ou não!), meu objeto de pesquisa é a versão de 2022 da novela “Pantanal”,
escrita por Bruno Luperi, neto do autor original Benedito Ruy Barbosa que, em 1990, revolucionou a teledramaturgia
brasileira na primeira versão exibida pela TV Manchete,
quando eu ainda nem era nascido.
No Lolla, além de atuar na gravação das peças comerciais de
Mc Donald’s, Budweiser e Bradesco, uma das cerejas do bolo
foi pilotar no autódromo de Interlagos, no S do Senna, mesmo
que a 20km/h no carrinho elétrico.
Pelo menos nesta nova versão, o Coronel Zé Leôncio é dono
da “Fazenda Mezenga”, o mesmo sobrenome do Bruno
de Antônio Fagundes em “O Rei do Gado”, a novela que me
fazia correr para frente da televisão. Aquela criança jamais imaginaria que dormiria na rede ao lado do mesmo diretor daquela obra prima, quase vinte anos depois, em uma aldeia indígena na Amazônia. Certamente isso não poderia ser
imaginado e para muitos soaria até como inverossímil.
Como nas novelas, onde nós autores brincamos com a vida
dos personagens em seus altos e baixos, a vida real também
guarda um plot twist atrás do outro, com viradas e ganchos surpreendentes que prendem para o próximo episódio.
E este foi só o primeiro ato.
Aguardem as cenas dos próximos capítulos!